terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Fui criado pertinho dos vaqueiros / Vendo tudo que havia no sertão

TEMA EM MARTELO AGALOPADO

Imagem: (arapiraca.al.gov.)








 
 
 
 
 
 
 
 
Os arreios pendurados na parede
Um carrinho brinquedo só de pau
Um menino tocando o berimbau
A novilha matando sua sede
Negro velho deitado numa rede
Os bois se esforçando no cambão
As sonoras batidas no pilão
Os trovões assombrando os tabuleiros
Fui criado pertinho dos vaqueiros
Vendo tudo que havia no sertão
 
Eu sentia o prazer das trovoadas
As pancadas das chuvas no telhado
O romper do gibão no alastrado
O amor da morena às madrugadas
Candeeiros brilhavam nas latadas
Nos forrós entre a pinga e o limão
O brilho do punhal na escuridão
Ou o rifle nas locas dos lajeiros
Fui criado pertinho dos vaqueiros
Vendo tudo que havia no sertão
 
Alvorada trazendo muita luz
O carão rodeando uma lagoa
Uma velha cantando faz a broa
Mesa grande com leite e com cuscuz
Uma reza ligeira pra Jesus
O balanço sutil do gavião
Um cavalo selado no mourão
O teiú rastejando os marmeleiros
Fui criado pertinho dos vaqueiros
Vendo tudo que havia no sertão
 
Mergulhei nos Barreiros da fazenda
Enfrentei faveleira, unha-de-gato
Tangi emas comi carne de pato
Comprava fiado numa venda
Namorava debaixo da moenda
Cacei onça e montei em barbatão
Só não quis atirar de mosquetão
Pra não ser mais um dos cangaceiros
Fui criado pertinho dos vaqueiros
Vendo tudo que havia no sertão
 
Era o leite da vaca logo cedo
O sol quente brilhando como o ouro
Uma faca cortando sola e couro
Carcará no pico do penedo
Umas dez polegadas sem ter medo
Das noites escuras do grotão
Era a foice, a enxada, o levião
Tilintando nas pedras dos aceiros
Fui criado pertinho dos vaqueiros
Vendo tudo que havia no sertão
 
A moça mais bonita era açucena
O esporte do homem a vaquejada
A comida gostosa era a buchada
Toda festa de santo era novena
Uma légua bem braba era pequena
Quando as pernas levavam o coração
Padre Cícero, Gonzaga e Lampião
Ladainhas, baiões e bandoleiros
Fui criado pertinho dos vaqueiros
Vendo tudo que havia no sertão
 Clerisvaldo B. Chagas

Nenhum comentário:

Postar um comentário