terça-feira, 3 de maio de 2011

Lampião uma história inglória


Amigos tomem assento
Nessa roda de cordel
Que vou cantar um lamento
Um pouco de mel e fel.

Vou falar de um brasileiro
Em Vila Bela nascido
Que tornou-se cangaceiro
Arrojado e destemido.

Foi há cerca de cem anos
Na Fazenda Ingazeira
Isso salvo algum engano
Me avisem se é besteira.

Veio ao mundo um menino
De José e de Maria
Foi chamado Virgolino
Oito irmãos ele teria.

Era um menino comum
Tinha uma boa família
E assim como qualquer um
Foi seguindo a sua trilha.

Cedo parou de estudar.
Pra ajudar no sustento
Foi para o pasto aboiar,
Pra garantir o alimento.

Foram Antonio e Levino
Dois de seus oito manos
Que mudaram o destino
E criaram novos planos.

Envolveram-se em brigas
Por marcações de terrenos
E muitas outras intrigas
Outros conflitos pequenos.

Graças à antiga guerra
Que a todos envolvia
Pelas preciosas terras
Uma grande rixa havia.

Lampião foi envolvido
Por essa luta de classe
E enfim virou um bandido
Nesse terrível impasse.

Um seu José Saturnino
Com eles vivia às turras
E o pai de Virgolino
Morreu nessa guerra burra.

O delegado Batista,
Junto com um imediato
De forma meio alarmista
Foi lá desvendar um fato.

Mas sendo bem trapalhão
Matou o José Ferreira
Em desastrada ação
Fazendo grande besteira.

Pra resolver o dilema
O infeliz delegado
Criou um maior problema
Matando um pobre coitado.

Virgolino transtornado,
Resolveu buscar vingança
A ação do delegado
Acabou-se em matança.

Uma tropa existia
Sinhô era o comandante
E Virgolino iria
Entrar nela nesse instante.

Sinhô passa o comando
Para o amigo Lampião
Que vai liderar o bando
Com uma implacável mão.

Ele jamais se cansa
De procurar o conforto
E de buscar a vingança
Pelo seu pobre pai morto.

Mas também há ambição
E há sede de poder
Que guiam a sua mão
Transformando o seu ser.

Virou um temido bandido
Lá pras bandas do Nordeste
Vivia sempre escondido
Num sofrimento inconteste.

Em Juazeiro do Norte
Chamado por Padim Ciço
Pensou que mudaria a sorte
Com valoroso serviço.

Levou uma reprimenda
Pelo seu mau proceder
E teve por encomenda
No interior combater.

A Coluna Prestes era
Causa de muitos transtornos
Uma medonha quimera
No Nordeste e entorno.

Esse forte movimento
Político-militar
Era um grande tormento
Um mal a se extirpar.

Em troca receberia
Pela colaboração
Uma total anistia
E patente de Capitão.

E lá se foi Lampião
Embrenhar-se pelo mato
No cargo de Capitão
A fim de cumprir o trato.

Mas na verdade era falso,
Uma mentira fajuta.
A polícia foi no encalço
O que rendeu muita luta.

Paraíba, Ceará,
E também em Pernambuco
Unidos para caçar
Era coisa de maluco.

Para evitar o fracasso
Enquanto estava no prumo
O nosso Rei do Cangaço
Partiu para outro rumo.

Bandeou-se pra Bahia,
Sergipe e Alagoas.
Lá teve melhores dias
Aquela área era boa.

Por lá um dia ele vem
Conhecer Maria Bonita
Maria Déia Nenén
Numa paixão infinita.

Filha de um sapateiro
A morena enfeitiçou
O temido cangaceiro
E com ele se casou.

Mais tarde, Maria Bonita,
Com Lampião por parteiro
Deu à luz Expedita
Embaixo de um imbuzeiro.

Ma a vida era dura
E o destino sombrio.
No meio da mata escura
Era bomba sem pavio.

A criança foi deixada
Com um fiel guardião
E seguiu sua jornada
O bando de Lampião.

O Benjamin Abraão,
Com carta de Padim Ciço
Teve a autorização
Assumiu o compromisso

De filmar o acampamento
Para um documentário.
Mostrando alguns momentos
Numa vida de calvário.

E ele filmou a vida
Daquela sociedade.
Suas roupas, a comida
E toda a fraternidade.

Lampião em sua roda
Desenhava o figurino.
Ele ditava a moda
Criando modelos finos.

Os chapéus, as cartucheiras
Ornados de ouro e prata
Pra vida sem eira nem beira
Para andar pela mata.

Pra que andar bem vestido?
Parece até contra-senso.
Porém isso faz sentido
Quando a respeito eu penso.

Eles tinham sua arte
E regras de convivência
Em um mundinho à parte
Com sua própria ciência.

Lampião era uma lenda
Até uma madrugada
Quando estava na fazenda
De nome Angicos chamada.

Chegou, então, a volante
Eu um proceder perfeito.
Devagar e num instante
O estrago estava feito.

Tenente João Bezerra
E o sargento Aniceto
Naquele momento encerra
A busca do desafeto.

Cuspiam fogo as metralhas
Criando imenso horror.
Não se conhece o canalha
Que foi o seu traidor.

Uns poucos tiveram sorte
E escaparam com vida.
No meio de dor e mortes
Encontraram uma saída.

Lampião foi dos primeiros
A receber um balaço.
Era o fim do cangaceiro
E era o fim do cangaço.

Lampião é degolado
Num proceder bem covarde.
O corpo é esquartejado
Pra ser exemplo mais tarde.

Maria Bonita, ferida,
Também foi sacrificada.
Ela perdeu a vida
Naquela infame cilada.

Naquele inferno de Dante,
Numa sanha assassina
Os malditos da volante
O cangaço extermina.

As cabeças arrancadas
Do bando de Lampião
Correram o mundo mostradas
Numa vil exposição,

Agora, meu bom amigo,
Eu peço sua atenção
E que reflita comigo
Em delicada questão.

Lampião não era santo,
Ao menos pelo que sei
Mas convenha, no entanto,
Que pra isso existe a lei.

O proceder da volante
Foi coisa de carniceiro.
Atitude revoltante
Pior que a dos cangaceiros.


de Josafá Maia da Costa
Rio de Janeiro - RJ

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