Igreja publica carta sobre seca no RN
Representantes
de instituições que atuam no campo se reuniram na última quarta-feira
(23) para debater o projeto de irrigação da Chapada do Apodi e o
fenômeno da seca no Rio Grande do Norte. Como resultado da reunião, uma
carta endereçada à presidenta Dilma Rousseff, à governadora do RN
Rosalba Ciarlini, aos prefeitos dos municípios do Estado e a toda
população Potiguar foi desenvolvida. O documento expõe a situação do
homem do campo e desenvolve 13 propostas direcionadas às autoridades. A
autoria da carta é do Fórum do Campo Potiguar (Focampo), Articulação no
Seminário do RN (ASA Potiguar), Província Eclesiástica de Natal,
Arquidiocese de Natal, Diocese de Mossoró, Diocese de Caicó e Associação
das Igrejas Evangélicas.
Segue a carta intitulada na íntegra em
mais informações logo abaixo:
" CARTA DO CAMPO POTIGUAR: pela afirmação da VIDA no Semi Árido e o enfrentamento da SECA, sua indústria e seus (des)governos "
O
grande problema não é a SECA, mas a sua mesquinha indústria e suas
CERCAS... Vivemos hoje uma das piores secas dos últimos 30 anos de nosso
semiárido brasileiro, que poderá, infelizmente, se prolongar até 2013.
Dos 167 municípios potiguares, 139 já decretaram Situação de
Emergência. Muitas das populações desses municípios, até mesmo em casos
de alguns servidos por adutoras, estão passando sede até na zona urbana
com o colapso de seus sistemas de abastecimento.
Pais
e mães de família estão saindo de suas comunidades rurais, de
reconhecidas produções leiteiras, para fazer filas nas mercearias e
prefeituras a fim de conseguir 1 litro de leite para seus
filhos. Agricultores/as sem o que colher e criadores/as sem o que
oferecer para seus animais tentam fazer algum dinheiro com a venda de
uma cabeça de gado, por um terço do valor, e muitas vezes não acham quem
a compre.
Numa avaliação unânime dos
movimentos sociais do campo, é preocupante a falta de iniciativa
própria do governo do RN. Percebemos a ausência de um plano de
enfrentamento dos efeitos da seca (emergencial) e de convivência
(estruturante e pedagógico) para a Agricultura Familiar e o
semiárido, seus problemas e respectivas propostas de soluções às
reivindicações apresentadas pelas representações dos trabalhadores/as. A
postura é exclusivamente de pedir e esperar pelo governo
federal. Nota-se a falta de planejamento, criatividade e postura pró-ativa!
Mediante
este quadro emergencial de estiagem prolongada e de baixa
resolutividade das autoridades públicas, no sentido de efetivar um
diálogo produtivo com as representações da Agricultura Familiar e fazer
acontecer medidas ágeis e eficazes, emergenciais e estruturantes, de
enfrentamento aos efeitos cruéis da seca, o conjunto das Forças Sociais
reunidas no Fórum do
Campo Potiguar - FOCAMPO
vem através desta Carta, abrir o diálogo com toda a sociedade
norteriograndense e suas autoridades constituídas. Falamos em nome dos
que mais sofrem com a seca, aqueles que têm suas VIDAS EM RISCO. Somos
nós: agricultores e agricultoras, sem terra, igrejas, associações,
sindicatos, federações de sindicatos, ongs, cooperativas... Povo de Deus
calejado e organizado. Temos apreendido a respeitar e conviver com o
nosso ambiente semiárido e seus ciclos de estiagem e queremos contar
pra todo mundo: 'o semiárido é lindo e passível de uma agricultura
diversificada e sustentável. Nós já vivenciamos esta experiência
sócio-ambiental há décadas, mas nos faltam acolhimento e apoio do Estado
para universalizá-la'!Há 10 anos atrás esta seca de hoje já teria se
alastrado numa calamidade social de grandes proporções, de sede, fome e
êxodo frenético para os grandes centros urbanos. Vivemos uma das maiores
estiagens de nossa história e não estamos assistindo a cenas de
desespero e saques de alimentos. Temos a convicção de que as
experiências de convivência com o semiárido que, como sociedade civil
organizada, conseguimos gerar e gerir, conquistar e difundir enquanto
políticas públicas do Estado brasileiro, como o Programa 1 Milhão de
Cisternas, efetivamente melhoraram as condições de vida e de produção
das famílias camponesas e estão ajudando a fazer a diferença no
enfrentamento deste início de seca. O que demonstra que a convivência
com o semiárido e a superação das
conseqüências da seca são
possíveis, na medida em que há COMPROMISSO DE INVESTIMENTO
DOS GOVERNANTES E ABERTURA PARA O DIÁLOGO E A ARTICULAÇÃO com as
entidades organizadas do povo do semiárido, propondo e construindo
alternativas apropriadas às realidades, às necessidades e
às potencialidades das experiências já vividas por este povo.
Na
contramão dessas experiências de produção agroecológica e convivência
adequada com o ambiente semiárido, estão as propostas intervencionistas e
excludentes das grandes monoculturas irrigadas de uso intensivo de
agrotóxicos e a implantação das cisternas de plástico. A história
dos Perímetros Irrigados nos moldes do atual Projeto do DNOCs para a
Chapada do Apodi, comprova a completa inadequação social e ambiental
desse modelo de produção e desenvolvimento para o nosso semiárido. As
cisternas de plástico constituem-se num dos maiores equívocos do governo
brasileiro.
Trata-se de uma tecnologia
extremamente cara, ineficiente, geradora de dependência externa e de
lixo ambiental com extensão de impactos pelos próximos 500 anos. É muito
importante destacar nesse momento crítico de seca que não é qualquer
pseudo-solução exógena que vai promover o desenvolvimento, a justiça
socioambiental e a qualidade de VIDA no campo que tanto almejamos
e merecemos para todos e todas.
Assim, movidos
por essa realidade adversa da atual estiagem; preocupados com a
inoperância e as falsas soluções que permeiam os agentes do Estado;
amparados na solidariedade das Igrejas Católica e Evangélica engajadas,
e, principalmente, embasados nos processos e resultados animadores
da experiência prática e teórica das tecnologias e metodologias
socioambientais de agricultura familiar sustentável e convivência com o
semiárido, já desenvolvido através da ASA Brasil, queremos chamar a
atenção das autoridades e da sociedade potiguar para o que propomos:
1.
Ampliação da representação da sociedade no "Comitê Estadual da Seca"
com a inserção de 05 novos legítimos representantes: igreja católica,
igreja evangélica, ASA, FOCAMPO e MST;
2. Divulgação e pressão
popular sobre os municípios que ainda não implantaram suas
Comissões Municipais de Defesa Civil, impedindo o acesso de seus
agricultores a todos os repasses e ações de atendimento pelas políticas
federais de emergência. Dos 139 em emergência, apenas cerca de
10 municípios concluíram os devidos procedimentos de habilitação;
3. Abastecimento com água potável das 75 mil cisternas (P1MC) de consumo humano já construídas no estado;
4. Abastecimento das 1.000 cisternas (P1+2) de água para produção já construída no estado;
5.
Liberação imediata pelo governo do RN de recursos próprios para
complementação de R$ 280,00 (5 parcelas de R$ 56,00) por família a ser
atendida pelo Bolsa Estiagem, de forma a equiparar às atendidas pelo
garantia safra;
6. Disponibilização pela CONAB para os
agricultores familiares de um kit de ração animal composto por milho,
trigo, babaçu, farelo de soja e torta de algodão ao preço de custo na
fonte para salvação do rebanho;
7. Criação de um Programa de
Assessoramento Técnico, Gerencial e Pedagógico para a Gestão Produtiva
dos Recursos Hídricos, a ser executado em sistema de co-gestão com a ASA
Potiguar pelo período de 3 anos ininterruptos.8. Concretização dos
compromissos assumidos pelo governo do estado perante as organizações
dos trabalhadores do campo:
a. Funcionamento autogestionário da Central de Comercialização nos próximos 30 dias
b. Funcionamento de todos os escritórios da EMATER com o Programa Compra Direta nas próximas 02 semanas
9.
Revogação do Decreto do governo federal que desapropria terras de
assentados da reforma agrária na Chapada do Apodi para instalação de
Projeto de Perímetro Irrigado do DNOCs
10. Não à instalação
das Cisternas de Plástico no estado. Com os recursos públicos destinados
a uma cisterna plástica dá pra construir 02 Cisternas com a tecnologia
social da ASA e o mesmo volume d água.
11. Que o Estado faça a
instalação imediata de todos os poços perfurados, recuperação e
manutenção dos existentes, perfuração e instalação de novos para
garantir água aos animais e usos diversos para os agricultores
familiares de todos os municípios do estado. Inclusive, disponibilizar
os equipamentos e máquinas existentes no estado e municípios para os
agricultores recuperarem seus açudes e fazerem poços amazonas.
12.
Que os Ministérios e órgãos competentes instituam um disque denúncia
por onde os cidadãos possam denunciar possíveis práticas viciadas da
antiga Indústria da SECA, de manipulação política e de enriquecimento
ilícito com os recursos e ações de emergência para "o polígono das
secas"
13. Que o Tribunal Superior Eleitoral crie uma
Campanha: "NÃO TROQUE SEU VOTO POR ÁGUA. ÁGUA É DIREITO SEU". O Brasil
tem o dever ético de não consentir que as medidas emergenciais da seca
se transformem em instrumentos de moeda eleitoral e desvirtuação das
eleições.
Enfim, o que reivindicamos é que o
agricultor familiar do semiárido potiguar precisa de
justiça, solidariedade e respeito aos seus direitos e saberes. Que Nosso
Senhor Jesus Cristo toque mais fundo o coração de nossos governantes
para que acolham o clamor e as experiências de soluções apropriadas
do Povo de Deus. Agora (na emergência da seca) e sempre (na estruturação
de obras e processos pedagógicos de convivência com o semiárido).
Subscrevem este documento:
Arquidiocese Diocese de Natal
Pastor Airton Schroeder
ASA Potiguar
FETARN
MST
STR de Apodi
FETRAF
PASTORAL DA CRIANÇA COOPERVIDA ATOS
SEAPAC
INST. CHAPÉU DE COURO TECHNE SAR
ASA Potiguar
TERRA VIVA
RENAP
SERTÃO VERDE
SAUR
FETARN
AACC
DIACONIA
PA Laje do Meio
CEAAD
MST
CPT
STTR de Passa e Fica
PASTORAL DO IDOSO
CUT-RN
STR de Apodi
COOPERCACHO "
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