terça-feira, 13 de outubro de 2015

CORDEL

O dia que fui Herói no sertão
Foi nos tempos passados
Que burro tinha valor
Notícia era por carta
Ou dada pelo locutor
De umas rádios AM
Nem se pensava em FM
E nem tinha o televisor

Os roçados empregava
O povo aqui do sertão
As casas tudim de taipa
As malas era o matulão
Os mininos tudo buchudo
Tinha até uns imbigudos
E outros com um cabeção

Mas todo mundo sonhava
Em um dia se casar
Construir uma família
Sonhando em prosperar
E assim também era eu
O plebeu dos plebeus
Mas querendo namorar

Um dia a sorte sorriu
E butou uma cabôca
Bem no meio da vida
Que me adoçou a boca
Foi lá na Pedra Preta
Indo buscar uma marreta
Pesada feita a gota

La na casa de pacote
Conheci a danada
Uma minina risonha
E muito abunitada
Cuidando dum bruguelo
Mago, chorão e amarelo
Ca tia tinha contratada

Minina eu fiquei doido
Varado alucinado
Falei logo namoro
Pois queria do meu lado
E a danada aceitou
Num é que ela gostou
Desse caba amatutado

Quase que num ia mais
Voltar pra cachoeira
Olhando pra belezura
Que perdi a estribeira
Tava gostando do amar
Eu queria era ficar
Chega esqueci a peixeira

Sai muntado no burro
Só se lembrando dela
E o burro trotando
E eu nem senti a cela
Foi uma tarde de viajem
Mas ainda tinha coragem
De voltar pra olhar ela

Na cachoeira à noite
Todo dia era medão
Por causa dum lobisomem
Que tinha na região
Ninguém saia de casa
E toda noite ele uivava
Como se fosse um cão

Todo mundo tinha medo
De no bicho até falar
Vai que ele tivesse perto
E pudesse escutar
Tinha homem que tremia
E toda noite acontecia
De um com ele se esbarrar


Tinha gente preparada
Com foice e machado
Enxada e ciscador
Tavam tudo armado
Faca, peixeira e canivete
Outros iam no bofete
Pra pegar o caningado

Agora o maior problema
Era ter um corajoso
Pra enfrentar o bicho
No meio dos medrosos
Alguém pra iniciar
E a peia começar
E ser o herói do povo

Aí minha namorada
Faz um convite a mim
Venha hoje aqui em casa
Se não vai ser o fim
Mostre que tem corage
Que me ama de verdade
E quero ouvir um sim

Rapaz nem pude negar
Mesmo ainda tremendo
Como eu ia voltar
Isso num tava acontecendo
Era hoje que o lobisomem
Jantava esse homem
Que de medo tava morrendo

Mas me montei no burro
E no caminho rumei
Cheguei à boca da noite
E por lá mesmo jantei
Era um pegado de Mão
Aqui acolá um beijão
Do jeito que sonhei

A noite foi se estendendo
E o veio só pigarreando
Era pra eu ir embora
Que já tava a incomodando
Eu peguei o meu jumento
E sai cortando o vento
E do lobisomem lembrando

Era noite de lua cheia
Chega o burro tremia
E eu já tava me borrando
No meio daquela agonia
E quanto mais andava
Mais a estrada aumentava
Sem saber o que viria

Bem perto do cemitério
Na descida da ladeira
Quase chegando em casa
Me deu uma tremedeira
Quando ouvi um uivo
Fiquei preto, branco, ruivo
Começou uma suadeira

Quando olhei pra traz
Ouvi umas tropeladas
O lobisomem correndo
Que a poeira levantava
Vinha no meu calcanhar
Perto de me abocanhar
Chega as orelhas abanava

Meu burro ficou duro
Num teve como mexer
E eu meti a espora
Querendo me socorrer
E o burro ali parado
Com o rabo arrepiado
E todo a se tremer


Vendo aquele perigo
Me prostei em ação
Botei o burro nas costas
E corri pra salvação
O bicho pega num pega
E eu quase perdia a prega
Naquela triste situação

Em meio o aperreio
O bicho mordeu o burro
Que dá um coice certeiro
E eu só escutei o urro
O lobisomem caiu na hora
E bateu na minha espora
Que parecia cum um murro

Tropecei na mesma hora
E saímos os três a bolar
Eu, o burro e o lobisomem
Pela ladeira a rolar
Entres urros, rincho e gritos
Foi o momento mais aflito
Que já pude vivenciar

O burro acertou outro coice
Na canela do caningado
Foi um coice bexiguento
Só escutei o estalado
Aproveitei a ocasião
E dei um cascudão
Q’ele ficou desorientado

La no pé da ladeira
Quando da queda paramos
O lobisomem fez carreira
Percebi que tava mancando
Segurando a canela
E a boca toda banguela
Chega tava sangrando

Nisso o povo da rua
Vieram em meu socorro
E eu limpando a poeira
E no burro dando expôrro
E o lobisomem chorando
A canela e cabeça segurando
Mancando subindo o morro

Quando vi o povo chegar
Que do perigo me livrei
Tive logo uma ideia
E rapidinho executei
Fiz carreira atrás do bicho
Serei agora bem quisto
Porque o peste eu surrei

Alcancei o lobisomem
Pulando pela estrada
É hoje que me faço
Dei logo umas lapadas
Chega o pêlo caia
O bicho urrava e gemia
Em meio as pancadas

O povo tudim me viram
A humilhar o lobisomem
Uns nem acreditava
Uns dizia esse é o homem
E eu todo importante
Começava naquele estante
Minha fama de super-homem

Foi noticia no sertão
A pisa que ele levou
Ate o pai da cabôca
Nunca mais me expulsou
Somente o meu jumento
Desde daquele momento
Nunca mais ele prestou

E também meus dedos
Ficaram mei intrevado
Do cascudo que dei no bicho
Quando de medo tava tomado
Em meio aquela aflição
Tornei-me herói do sertão
A cascudo vei condenado

O lobisomem desapareceu
Ninguém nunca mais viu
Dizem que foi embora
Até mesmo do Brasil
Com medo de me encontrar
E outra pisa levar
Por causa disso sumiu

Agradeço a meu burro
E o tropeço que levamos
Os coices que acertou
Que deixou o bicho mancando
Os dentes tudo quebrado
O peste desesperado
E o povo me aclamando.
Lino sapo

Um comentário:

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