segunda-feira, 3 de agosto de 2015

História Viva

Raimundinho do Misto completa 53 anos fazendo a linha Limoeiro-Mossoró

Raimundo de Freitas, ou Raimundinho do Misto: 53 anos de volante e muitas histórias pra contar entre os caminhos de Mossoró e Limoeiro do Norte – Foto Ednilto Neves

Aos 86 anos, Raimundo de Freitas Nunes, mais conhecido pelo apelido de Raimundinho do Misto, acorda às 2h30 da manhã, de segunda a sábado para… trabalhar.

Motorista mais veterano da cidade, foi o primeiro a fazer a linha Limoeiro-Tabuleiro-Mossoró, no longínquo ano de 1962. Naquele 1o de agosto, Raimundinho não imaginava que a estrada cheia de buracos, ainda no barro, seria melhorada e a viagem também.
Em visita à GAZETA DO OESTE, o folclórico motorista – a carteira está em dia, ele diz logo, ao falar sobre sua profissão – se orgulha de fazer parte de um tempo em que o transporte de passageiros era feito de forma mais humana e que as pessoas “se respeitavam mais”.

“Fui o primeiro motorista dessa linha. Minha empresa chegou a ter sete ônibus. Devido à concorrência e outros fatores, como padrão de veículos instituído pela Federal, não posso circular com passageiros no misto”, fala, saudoso, o ancião de 86 anos, que ainda dirige – “eles colocaram minha carteira para categoria B”, fala, sorrindo e comentando que se sente feliz por ter ajudado a tantas pessoas, durante todos esses anos.

“Mesmo que meu motorista falte, eu trabalho. Todos os dias estamos na ativa. Creio que sou o mais antigo do ramo”, revela Raimundinho, abrindo um sorriso sereno e destacando o papel fundamental da família em todo esse processo.

“Tenho sete filhos, todos pessoas boas!”, salienta, e sorri quando é questionado pela reportagem sobre a quantidade, mais uma vez. “Querem me testar? Sempre fui casado com uma só mulher e só tenho esses sete”, fala, soltando um sorriso largo, sorriso do bom cearense que recebeu, há alguns anos, o título de cidadão da terra de Santa Luzia.
Uma vida, uma história
Viagens que duravam de três a quatro dias, dentro de atoleiros enormes, sem perspectiva de chegada, eram comuns na via hoje praticamente asfaltada, em toda sua extensão. “Uma vez eu saí de Limoeiro na segunda-feira e cheguei a Mossoró somente na quarta. Foi uma coisa absurda essa viagem: fome, sede, tudo apareceu. Cheguei cansadíssimo, mas era meu papel”, destaca, explicando que durante todos esses anos deu “muita carona a trabalhadores que iam para outras cidades à procura de trabalho honesto”.

“Uma vez cheguei a dar carona para 11 deles, que iam à procura de emprego”, explica, saudoso do tempo em que o misto lhe dava dinheiro. “Hoje, estou com os dois mistos em Limoeiro. Alugo-os para eventos, mas não posso transportar passageiros em BRs. Aqueles dois me deram muito dinheiro. Tenho amor por eles!”, frisa.

Entre as histórias que guarda das inúmeras viagens que fez, uma chama a atenção pela peculiaridade: um parto em plena BR. “Naquele ano, eu transportava uma senhora grávida. Em determinada altura da BR, ela começou a sentir as dores do parto. Encostei o misto, olhei para um lado e outro. Não tinha como prosseguir e, na marra mesmo, sem saber de nada sobre o assunto, fiz aquele parto no meio do nada, na estrada. Logo depois, ela teve de voltar para o Ceará a fim de procurar ajuda de um especialista. Soube, muitos anos depois, que sua filha goza de boa saúde, mora em São Paulo e vive bem. Fui médico por um dia!”, comenta, brincando com um pequeno bordão momentâneo: “Sou o rei dessa lotação Limoeiro-Mossoró!”, finaliza o pequeno homem, bravo motorista de um misto que, até pouco tempo, transportava sonhos e esperanças por dias melhores.
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